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Mulheres na Mineração

A luta das mulheres pela equidade de gênero, por condições igualitárias na sociedade, no mercado de trabalho, e na vida de um modo geral, tem ganhado cada vez mais espaço. No mundo todo, há um movimento de fala sobre o tema e sobre tudo que há muitos anos incomoda as mulheres. Porém sabemos que grande parte dos setores de mercado privado formal ainda possui maioria de profissionais homens.

Segundo dados demográficos das empresas, em pesquisa do IBGE (2015), o setor mineral tem quase 90% de profissionais homens. Em todas as áreas, o salário da mulher é menor; em alguns casos, como o da extração de Petróleo e Gás, o rendimento médio mensal chega a ser inferior cerca de 50% quando a profissional é do gênero feminino.

Em 2017, em relatório divulgado pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), intitulado “Em busca da igualdade de gênero: uma batalha difícil”, uma das principais conclusões do estudo é que, nos últimos cinco anos, os países progrediram pouco para atingir a igualdade de gênero. Em média, nos países da OCDE, da qual o Brasil faz parte, as mulheres já ultrapassam os homens nos resultados escolares, mas as desigualdades no empreendedorismo, no emprego e na vida pública continuam, e poucas mudanças são percebidas nos últimos anos.

Conversamos com três profissionais que já trabalharam ou ainda estão no setor mineral e é unânime entre elas que as diferenças ainda existem, são visíveis, mas que as mulheres estão conquistando dia após dia seu espaço, com esforço e muita dedicação. A geóloga Cimara Monteiro acredita que essas características têm sido o grande diferencial: “Aquelas que se submetem a esse regime de trabalho sabem que, para serem respeitadas e se destacarem, precisam se esforçar, dedicar-se e serem muito disciplinadas”.

A consultora da área ambiental, Lucélia Carneiro, comenta que a mulher tem provado sua capacidade e condições em atuar nos mesmos limites dos homens e por isso tem aberto esses espaços. “Temos presidentes de empresas, como já tivemos na Anglo América, por exemplo, e temos motoristas de caminhão fora de estrada, coisas que há 15 ou 20 anos era totalmente impensável” observa.

Neste setor a disciplina é fator importante para a valorização do trabalho feminino. Por isso a geóloga Camila Esmeris, Coordenadora de Geologia da LDS Mineração do Brasil, acredita que os gestores muitas vezes preferem trabalhar com as mulheres: “Este caminho foi trilhado com muito esforço desde a década de 1970, com a inserção das mulheres na academia de ciências exatas, enfrentando enormes resistências e discriminação. Mas, com o passar dos anos, e até hoje, nos firmamos na profissão a partir da demonstração de grande competência, capacidade e qualificação profissional”. Ela recorda uma frase de uma professora na graduação: “a mulher tem sempre que provar que é boa em tudo, e duas vezes. As primeiras geólogas abriram as portas a partir de seu exemplo profissional, e nós, que viemos depois, afirmamos e mantemos viva essa característica de competência profissional” conclui Camila.

Para Lucélia Carneiro, a mineração tem um grupo de trabalhadores com idade avançada, já que as pessoas ficam na mineração por muito tempo. “Tenho 20 anos na estrada, e há colegas que têm 40”; e, então, acredita que com a renovação dessas pessoas o ambiente vai se modificando de forma natural. “A tendência é que o setor mineral vá se atualizando, e vá aceitando mais as mudanças” comenta.

Fazer parte de um setor socialmente reconhecido como masculino não é mais entrave para as mulheres, Camila esclarece que “já existe uma preocupação na mineração, principalmente nas grandes mineradoras” com relação à equidade de gêneros, inclusive com aderência de programas como o Programa Pró-Equidade de Gênero e Raça”. Este programa tem por objetivo aprofundar o compromisso com a igualdade racial e de gênero, por meio do desenvolvimento de novas concepções de gestão de pessoas e cultura organizacional. Ela acredita que, para que haja este equilíbrio na empresa, é necessária uma postura do gestor da Organização: “seja o gerente, o diretor ou o CEO da Companhia, em conjunto com a reestruturação interna da empresa e com o envolvimento dos setores de RH, administrativos e técnicos capazes de gerar um ambiente favorável à promoção da equidade de gênero e raça, favorecendo, assim, o fortalecimento das relações humanas”.

Lucélia Carneiro acredita que, devido ao fato de as empresas de extração mineral terem sido, historicamente, umas das últimas a se abrirem para o gênero feminino, apareçam mais. “Talvez, também pela atividade que é um pouco mais bruta, o processamento das relações seja difícil nas empresas de ambiente masculino de um modo geral” observa Lucélia.

Sobre o trabalho de campo ser mais “pesado”, Cimara afirma que no geral as mulheres fazem menos atividades de campo e mais atividades de escritório. Talvez, por isso assumam posições de coordenação ou supervisão. “Comigo ocorreu assim, eu ficava chateada por fazer poucos trabalhos de campo, mas por outro lado tive a oportunidade de aprender mais sobre gestão. Sinto que perdi um pouco como pesquisadora em geologia, mas ganhei muito como gestora e aprendi muito sobre técnicas de prospecção”.

Para Camila Esmeris, é fato que algumas tarefas necessitam de apoio masculino para execução: “nossa força física é menor, mas o que devemos discutir é a soma dos fatores “gênero” e não a diferença entre eles”. Além de trabalhar em Lavras do Sul, onde atualmente está estabelecida trabalhando com pesquisa de ouro, Esmeris já trabalhou no Maranhão, no Pará e em Goiás, pesquisando o mesmo mineral, e diz que nestes dez anos em que trabalhou no setor mineral nunca sofreu preconceito por ser mulher. “Em todos estes locais também haviam geólogas atuantes e outras que já haviam passado por lá; vejo que normalmente o pessoal que integra a equipe de geologia é muito unido neste sentido e há bastante respeito profissional. Acho que sofri mais preconceito por ser do RS, gaúcha, do que pelo fato de ser mulher”.

Lucélia concorda, e diz que o fato de ser mulher nunca foi motivo para que se sentisse diminuída. “Mesmo que alguém me olhe e diga que por ser mulher não conseguirei fazer bem feito, o que socialmente “deveria” ser feito por um homem”. No meu trabalho, os aspectos mais significativos não guardam relação com gênero, e hoje é estratégico dentro do contexto da organização. “Não se faz mais nada sem um trabalho de comunicação consistente e um licenciamento ambiental na área de mineração. Então é um trabalho muito dinâmico, com alto grau de incerteza e que é fundamental para o desenvolvimento, tanto de uma empresa júnior, como as que ainda não tem operação, como também, por exemplo, na manutenção da operação de uma empresa de mineração que já tenha sua lavra”.

Cimara hoje em dia trabalha no Serviço Geológico do Brasil (SGB/CPRM) e nesses quatro anos de empresa já foi supervisora, gerente e, atualmente, é coordenadora executiva e atua em atividades burocráticas referentes ao Centro de Desenvolvimento Tecnológico da empresa.Ela conta que, quando trabalhava na mineração, era responsável por banco de dados, relatórios de pesquisa mineral e descrição de testemunhos de sondagem. Portanto praticamente não fazia atividades no campo e era mais exigida no escritório.

Em alguns momentos históricos da mineração no Brasil, como na década de 80 em Serra Pelada (PA), a presença de mulheres na mina era quase que em sua totalidade voltada à prostituição, além de algumas esposas que acompanhavam seus maridos mineiros. Talvez por isso a imagem da mulher neste ambiente ainda seja motivo de debate.

O setor de extração mineral mudou e as relações dentro das empresas também. Lucélia acredita que nenhum trabalho no mundo é feito sozinho e que procura aprender com os colegas e ensinar tudo o que sabe. “A relação humana é um ponto importantíssimo do trabaho. A gente convive por muito tempo, tem opiniões divergentes, mas precisamos debater, ajustarmo-nos, e trabalhar em parceria para que o resultado da empresa seja o melhor possível”.

Lucélia conta que já teve algumas situações desagradáveis, mas que não a atingem mais. “Eu tenho muito amor pelo que faço e acredito muito no que eu faço, então acho que isso passa para os meus colegas de forma positiva e toda vez que alguém reconhece o valor de meu trabalho é muito bom” comenta. Para ela o preconceito existe em todos os ambientes de trabalho, e ainda existem muitas barreiras para superar. “Preconceito está no outro, não em mim, então eu não deixo que ele me atinja” conclui.

A geóloga da CPRM, Cimara Monteiro, relata que hoje vê como exceção os casos de preconceito, mas que já passou por situações desagradáveis. “Logo no início da carreira tive minha competência testada, e meu companheiro de estágio, um homem, não. Em outra situação, já em uma posição de coordenação, discuti com um técnico experiente sobre a forma como ele vinha se comportando na empresa, e a discussão desceu a um nível baixíssimo. Pedi imediatamente seu deslocamento”. Mas relata que também conheceu pessoas fantásticas, que a acolheram, respeitaram e ensinaram muito. “Sempre fiquei com o melhor quarto da casa que alugávamos como escritório (na época da mineração). Me sentia muito cuidada. Para mim essa relação sempre foi muito saudável e me deixou com muita saudade”, mas observa que é visível que, para alguns homens, é difícil ser comandado por mulheres ou simplesmente trabalhar com elas, mas é enfática ao dizer que “isso é um problema deles, pois a sociedade está mudando e isso não tem volta. Ou eles se adaptam, ou vão ter problemas”.

Lucélia diz que não vê mais a discriminação explícita, mas sabe que existe de forma velada. “Prefiro focar nas coisas que foram boas, nas vezes que confiaram em mim e que me apresentaram o trabalho e disseram “se vira”. Foi isso que me fez crescer”. Ela acredita que a mineração lapidou inclusive a capacidade de desenvolver o pensamento crítico. “Aprendi a trabalhar em equipe e acho que isso é um diferencial”.

No caso de Camila, ela conta que a empresa onde trabalha é muito diversificada neste sentido, e que muitas meninas ocupam cargos importantes e de confiança. “Trabalhamos em harmonia e existe muito respeito entre todos os colaboradores, da gerência e diretoria da empresa para conosco” comenta. Ela diz que é engraçado o fato de muitas pessoas acharem que mulher que trabalha nas geociências, ou nas ciências exatas em geral, são mulheres feias e desarrumadas. “Já escutei de algumas amigas: ah, você não é uma geóloga normal. As vezes nós mesmos criamos estes esteriótipos e preconceitos, que não foi negativo nesse caso, mas curioso”. Ela acha que teve muita sorte porque nunca sofreu nenhuma discriminação. “Já ouvi relatos de outras colegas de profissão que na entrevista de emprego perguntaram se eram casadas ou tinham filhos, pois optariam por profissionais solteiras. Acho que as mulheres têm esse peso junto com a profissão, não há como negar. Muitas ingressam no mercado de trabalho, mas não conseguem se manter, muitas vezes pela falta de apoio em casa e de incentivo da empresa em investir em medidas alternativas que facilitem a conciliação da vida pessoal e profissional da mulher”.

Para Camila Esmeris, deveríamos mudar o foco da discussão e nos concentrar na igualdade, na qualidade e no somatório das partes e não nas diferenças.

 

Nossos entrevistados:

Camila Esmeris: Geóloga formada pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos, com experiência na área de Geociências, atualmente é Coordenadora de Geologia da LDS Mineração do Brasil, e trabalha em projeto de pesquisa de ouro em Lavras do Sul.

Cimara Monteiro: Bacharel em Geologia pela Universidade de Brasília em 2006, mestre em Prospecção e Geologia Econômica pela mesma universidade em 2009, pesquisando fosforitos neoproterozóicos no Grupo Bambuí em Arraias (TO), Campos Belos (GO). Atualmente integra o Serviço Geológico do Brasil (CPRM) como pesquisadora em geociências.

Lucélia Carneiro: Formada em Administração com especialização em gestão ambiental, tem mais de 10 anos de experiência em licenciamento ambiental, relação com comunidades e responsabilidade socioambiental.

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